Publicamos hoje outro artigo traduzido, desta vez escrito por Ryan Leavengood, tesoureiro da Haiku Inc. e um dos principais desenvolvedores deste sistema operacional. Diferentemente do artigo anterior, este apresenta um ponto de vista mais de quem conhece profundamente o sistema, inclusive dando uma aula incrível sobre threads que me lembrou os bons tempos das aulas de Arquitetura dos Sistemas Operacionais. Este é um artigo para ser lido e relido umas trocentas vezes... ;D
A
alvorada do Haiku OS
Como
uma equipe de voluntários trouxe de volta um sistema operacional falido
Por
Ryan Leavengood / maio de 2012
(tradução nossa)
Era verão de 2001 e o programador de computadores Michael Phipps tinha
um problema: seu sistema operacional favorito, BeOS, estava para ser
extinto. Ter uma ligação emocional a uma pedaço de software pode lhe
parecer estranho, mas para Phipps e muitos outros (inclusive eu), o
BeOS merecia. Ele rodava incrivelmente rápido no hardware de sua
época; tinha uma interface de usuário limpa e intuitiva; e oferecia
um rico, divertido e moderno ambiente de programação. Em resumo,
nós o achávamos muito superior a todos os outros sistemas
operacionais para computador disponíveis. Mas a companhia que tinha
criado o BeOS não poderia mantê-lo no mercado e seus ativos,
incluindo o BeOS, estavam sendo vendidos a um competidor.
Preocupado
se, sob um novo proprietário, o BeOS teria uma morte lenta e
insuportável, Phipps fez a única coisa lógica que pôde pensar:
ele decidiu recriar o BeOS completamente do zero, mas como código
aberto. Um sistema de código aberto, ele raciocinou, não pertence a
nenhuma companhia ou pessoa, então ele não pode desaparecer apenas
porque uma empresa vai à falência ou os desenvolvedores principais foram
embora.
Agora
se você já tiver programado antes, saberá que
criar um sistema operacional é um trabalho enorme. E esperar que as
pessoas o façam sem pagá-las é uma maluquice. Mas para as dezenas
de desenvolvedores voluntários que tem trabalhado no Haiku, tem
sido um trabalho de amor. Nos 11 anos desde que o projeto começou,
nós lançamos três versões alfa do software e este mês esperamos
lançar o quarto e último alfa. Depois disso nos moveremos para o
estágio beta, do qual esperamos sair no fim do ano, seguido pelo
primeiro lançamento oficial, conhecido como R1, no início de 2013.
Mesmo
agora, qualquer pessoa pode instalar e rodar o sistema operacional em
um computador baseado no Intel x86. Muitos daqueles que o fizeram
comentam que sentiram as versões alfa do Haiku tão estáveis quanto
a versão final de qualquer outro software. De fato, de todos os
muitos sistemas operacionais alternativos hoje em atividade, o Haiku
é provavelmente o melhor posicionado para desafiar sistemas
operacionais dominantes como Microsoft Windows e Mac OS. Para
usuários e desenvolvedores, a experiência de rodar o Haiku é
incrivelmente consistente e, como o BeOS, ele é rápido, responsivo
e eficiente. Além do mais, o Haiku, diferentemente de seus mais
estabelecidos competidores, é extremamente bom em enfrentar um dos maiores desafios da computação moderna: microprocessadores de núcleo múltiplo. Vamos dar uma olhada no porque isso acontece, como o Haiku
surgiu e se o sistema operacional rodando no seu computador realmente
funciona tão bem como deveria.
Primeiro,
uma pequena história. Em 1991, um francês chamado Jean-Louis Gasset
e muitos outros ex-empregados da Apple fundaram a Be Inc. porque
queriam criar um novo tipo de computador. Em particular, eles
buscaram escapar da armadilha de retro-compatibilidade que testemunharam na Apple, onde cada nova versão de hardware e software
tinha que levar em conta anos de sistemas legados, verrugas e tudo. O
primeiro produto da companhia foi um computador de mesa chamado de
BeBox. Não encontrando outro sistema operacional que fosse de
encontro a suas necessidades, os engenheiros da Be escreveram o seu
próprio.
Lançado
em outubro de 1995, o BeBox não durou muito. O BeOS, por outro lado,
rapidamente encontrou um pequeno mas leal séquito e logo estava
rodando em PCs baseados no Intel x86 e clones do Macintosh PowerPC.
Naquele momento a Apple já considerava o BeOS como um substituto do
seu próprio sistema operacional. A companhia eventualmente lançou
uma versão despojada do BeOS para aparelhos de Internet, mas isso
não foi o suficiente. Em 2001, a Palm adquiriu a Be por divulgados
US$ 11 milhões.
Assim
que a venda da Be estava sendo finalizada, Phipps lançou o projeto
Haiku, que na época era conhecido como OpenBeOS (o nome mudou poucos
anos depois).
Desde o princípio, Phipps decidiu que o foco singular do projeto seria ser
replicar o último lançamento oficial do BeOS, conhecido como R5.
Em retrospectiva, esse foi um golpe de gênio. Esforços em código
aberto, geralmente feitos por diversão no tempo livre das pessoas,
pode algumas vezes fracassar ou se desviar sem mesmo lançar algo
tangível. O Haiku evitou esse destino porque todos os seus
desenvolvedores acreditavam no objetivo de replicar o R5.
Ainda assim,
Phipps e aqueles que se juntaram a ele tiveram seu trabalho repartido
entre eles. Um sistema operacional é extremamente complexo,
especialmente um tão abrangente como o BeOS, do qual várias camadas
e aplicativos tinham sido projetados desde o início para
trabalhar juntos. Alguns dos engenheiros mais talentosos em Silicon
Valley tinham desenvolvido o software ao longo de mais de dez anos.
Recriar tal sistema com uma equipe formada unicamente por voluntários
trabalhando no seu tempo livre era uma ideia maluca. Mas foi assim que o Linux surgiu, bem como os softwares GNU da Free Software
Foundation, do GNU C Compiler ao GnuCash, um programa
de contabilidade.
Bem como as camadas de um bolo, um sistema computacional consiste do
hardware, um sistema operacional que gerencia o hardware e os
aplicativos que rodam dentro do sistema operacional, tais como
navegadores Web, editores de documentos e coisas divertidas como
jogos. O sistema operacional é também o meio pelo qual os programadores dão instruções ao hardware.
Por sorte,
o BeOS foi escrito de maneira modular, fazendo-o relativamente
simples de desenvolver, testar e então substituir cada componente
do BeOS com seu equivalente em código aberto. Umas poucas partes do
BeOS já tinham sido lançadas pela Be como código aberto, tais como
o Tracker e o Deskbar, os quais são equivalentes ao Explorer e a
Barra de Tarefas do Windows e ao Finder e Dock do OS X. Um dos
primeiros blocos de código que os voluntários abordaram foi o kit
do protetor de tela, o qual tinha uma função muito simples mas
também um monte de peças móveis. Dentre outras coisas, ele tinha
que constantemente monitorar a atividade no teclado e no mouse,
carregar as definições da proteção de tela nos momentos certos e
pedir a senha quando a proteção de tela é desligada. Uma vez que
todas as peças haviam sido bem fixadas, Phipps substituiu o protetor
de tela do BeOS com a versão em código aberto e para surpresa
e alegria de todos, ele funcionou. Mais importante, foi uma prova de
conceito que mostrou aos desenvolvedores que eles podiam substituir
cada módulo no BeOS e saber que seria totalmente
compatível.
Em
2008 atingimos um marco. O Haiku, como qualquer peça de
software, é escrito em código fonte; para convertê-lo para
instruções binárias que o computador possa processar, você precisa
compilá-lo. A descoberta foi que finalmente fomos capazes
de compilar o código fonte do Haiku a partir do próprio sistema; os
programadores referem-se a esta característica como “self-hosting”.
Este passo é crítico no desenvolvimento de qualquer sistema
operacional porque, sem ele, haverá sempre dependência de outros
sistemas.
Mesmo com o desenvolvimento em curso, Phipps estava
trabalhando para criar um lar organizacional para o Haiku,
finalmente fundando a Haiku Inc. como uma organização sem fins
lucrativos em 2003. Além de supervisionar o projeto e receber
donativos, a Haiku Inc. detém os direitos autorais e as marcas
registradas do sítio web do Haiku, da logomarca e, naturalmente, do
código fonte. Todo o código fonte do Haiku é agora licenciado sob
o que é chamado de Licença MIT, a qual permite o uso integral e gratuito do
código por praticamente todo mundo, incluindo companhias privadas
e outros projetos de código aberto.
Naturalmente,
o time do Haiku também está consciente de não infringir as
patentes do BeOS, as quais ainda estão vigentes. Em geral, nós
mantemos uma relação amigável com a companhia japonesa de software
Access, que agora detém os direitos do BeOS; por exemplo, a
companhia permitiu-nos publicar a documentação do BeOS em nosso
sítio web e nunca contestou quaisquer dos nossos esforços para
replicar a tecnologia do BeOS. Poderia a Access ou alguma outra
corporação que acredite ter o direito ao nosso código escolher
processar um pequeno projeto de código aberto como o nosso?
Financeiramente, não faria muito sentido e geraria também muita publicidade ruim. Mas vamos ter que esperar pra ver. Dado o atual
estado frenético de litígios de propriedade intelectual nos
Estados Unidos e outros países, nenhum projeto de software pode ser
considerado completamente imune a problemas legais.
Em
2007, Phipps anunciou que estava deixando o projeto por motivos pessoais e
um novo grupo de pessoas assumiu o comando da Haiku Inc. Assim como Phipps tinha antecipado no início, a perda de um líder não condenou o projeto. Eu sou atualmente o tesoureiro e, junto
com os outros executivos da Haiku Inc., faço parte da sua diretoria. Mantivemos o ritmo e na última reunião em
Dusseldorf, Alemanha, no início de abril, os desenvolvedores do
Haiku trabalharam na iminente versão alfa.
Neste
ponto, nós temos replicado o BeOS R5 tão precisamente que os
aplicativos BeOS legados, agora com mais de 10 anos de existência,
podem rodar no Haiku. Quando o projeto começou, muitos pensaram que
este tipo de compatibilidade seria impossível. E em muitas áreas
chave, o Haiku superou seu antecessor. Por exemplo, o Haiku suporta
mais idiomas que o BeOS e é mais fácil de internacionalizar de outras maneiras também. Ele também pode manusear placas de vídeo
modernas, processadores mais novos, acesso à rede sem fio e suporta
mais memória do que o BeOS.
E
em termos de programação, o Haiku torna muito fácil o desenho de
interfaces de usuário para aplicativos, porque ele tem uma
ferramenta de layout embutida que permite colocar automaticamente ícones e outros dispositivos na tela. Com o BeOS, por exemplo, os
desenvolvedores tinham que especificar cada mínimo detalhe do
layout e alinhar à mão botões com caixas de verificação. Estas e outras melhorias tem permitido ao Haiku permanecer
relevante, apesar do ritmo ultra-rápido das inovações em hardware e
software.
Mesmo assim, você pode estar se perguntando: com Windows, Mac OS X, centenas de versões do
Linux e numerosos sistemas operacionais móveis, o mundo realmente
precisa do Haiku?
Sim,
precisa, por muitas razões. Tal como na Natureza, vírus de
computador florescem em uma monocultura; e porque tantos de nós usam
computadores Windows, seus vírus encontram abundância de
vítimas. Além disso, se um sistema operacional tem um monopólio,
seus criadores têm poucas razões para melhorar seu
software (a concorrência do navegador Mozilla Firefox é, afinal, em grande parte o que levou a Microsoft a atualizar o
Internet Explorer). E a diversidade promove interoperabilidade porque
obriga os desenvolvedores de software a criar código que roda bem
com outros sistemas. Quando existe muito pouca concorrência, não
existe incentivo para fazê-lo.
Mas
o Haiku faz mais do que apenas expandir o conjunto genético dos
sistemas operacionais. Uma das primeiras coisas que as pessoas percebem sobre ele é que não se parece em nada com o Windows, OS X ou
Linux. Ele é único. O Linux, por exemplo, é baseado em torno de um
núcleo – chamado de kernel – que foi originalmente desenhado
para uso em servidores e apenas mais tarde modificado para sistemas
desktop. Em consequência, o kernel, por vezes, dá pouca atenção
à interface do usuário, o que os usuários Linux experienciam como
atrasos irritantes quando seus computadores estão fazendo coisas especialmente pesadas, como queimar um DVD ou compilar código.
O kernel do Haiku sempre foi voltado para sistemas desktop e por isso
sempre dá prioridade a qualquer coisa que esteja acontecendo na sua
interface gráfica de usuário.
Entre
o kernel e a interface gráfica de usuário está o que é conhecido
como interface de programação de aplicativos ou API. Uma API é o
que os desenvolvedores de aplicativos usam para acessar outros
sistemas de software e o desenho daquela API pode afetar tanto os
desenvolvedores como os eventuais usuários de seus softwares. O Haiku
possui apenas uma API. O Linux, em contraste, possui centenas de APIs
e sobre elas muitas interfaces de usuário, então você não pode
apenas trocar suavemente de uma versão do Linux para outra. A versão
que você utiliza pode alterar significativamente a aparência da tela do
seu computador, o modo como os programas inicializam e executam e
várias outras coisas, tudo o que torna bastante difícil desenvolver software que sempre funciona bem em todos os
sistemas Linux.
Todos
os componentes do Haiku são desenhados para trabalhar juntos desde o
início; isso inclui seus aplicativos, como o tocador de mídia e o
navegador Web. Seu código fonte até usa um estilo consistente,
algo que os desenvolvedores verdadeiramente apreciam, porque lhes permite
chegar rapidamente à velocidade. Um desenvolvedor escrevendo
código para o Haiku pode estar seguro de que ele irá funcionar e agir
da mesma maneira em todas as instalações do Haiku. Embora o Haiku
seja de código aberto, sempre existirá apenas uma versão oficial.
Tudo isso combina para oferecer uma experiência de usuário
muito consistente.
O
que realmente destaca o Haiku, entretanto, é sua eficiência e
velocidade. Em meu computador de três anos de idade, o Haiku
inicializa de uma partida a frio em 10 a 14 segundos e quando em execução ele utiliza cerca de 170 megabytes de RAM. Comparado com outros
sistemas operacionais, é fantástico ao maximizar os recursos
computacionais disponíveis. O Haiku demonstra ser rápido e responsivo
mesmo quando rodando em sistemas antigos que seriam
considerados obsoletos por não poderem mais lidar com a
ineficiência e inchaço dos outros sistemas operacionais.
Muito
da eficiência e velocidade do Haiku é um resultado direto do seu
legado BeOS. O BeOS foi desenhado desde o início para fazer pleno
uso de threads, o que em termos de computação representa sequências
de execução de código. Assim como um pano consiste de muitos fios
(threads) tecidos juntos, um sistema operacional é feito de threads
e eles têm de partilhar tempo no processador. Geralmente, existe um thread
para cada aplicativo e um também para a interface de usuário do sistema
operacional. O problema é que a interface de usuário em
particular necessita mais do que um thread. Aquelas mensagens
“o aplicativo não está respondendo” no Windows e a “bola de
praia da morte” (spinning pinwheel) no OS X – que a maioria de
nós experimentamos com alguma regularidade e frustração – são o
resultado direto de usar apenas um thread para a interface do
usuário. Quando aquele thread fica muito carregada de trabalho ou
tem outro problema (como uma rede lenta), a interface inteira do
aplicativo fica travada.
Isso
não acontecia no BeOS e não acontece no Haiku. Onde o BeOS seguiu à frente dos outros sistemas operacionais de sua época (e onde o Haiku
está ainda á frente dos sistemas operacionais contemporâneos) é
que cada aplicativo individual utiliza muitos threads. O núcleo do
próprio aplicativo tem um thread e cada janela que o aplicativo cria
tem um thread. Embora isto possa tornar o código um pouco mais
complicado para escrever, o resultado é que os aplicativos quase
nunca atrasam ou travam.
Este
sistema altamente entremeado significa que o Haiku pode fazer maior
uso de múltiplos processadores ou núcleos de CPU, que são agora onipresentes. O kernel Haiku permite a cada thread rodar em seu próprio
núcleo ou processador – mesmo threads dentro do mesmo aplicativo.
Adicionar mais threads para outras tarefas, como recuperar dados de
uma rede, é também simples. Outros sistemas operacionais fazem uso
de núcleos múltiplos apenas quando executando muitos aplicativos ao
mesmo tempo ou quando um aplicativo em particular tem um código
especial para multithreading adicionado a ele. Mas este código é difícil de escrever, então a maioria dos aplicativos
não o possuem.
O
Haiku simplifica o processo de escrever código para multithread pela
ocultação da maioria das interações de threads com as quais o
desenvolvedor não precisa se preocupar. Uma grande parte do que faz
este trabalho é o uso extensivo de message passing. Digamos que o
Thread A e o Thread B em um aplicativo querem recuperar uma parte dos
dados do Thread C. Em vez de acessar diretamente aqueles dados, os
Threads A e B passam cada um uma mensagem, as quais são colocadas em uma
fila central de mensagens e distribuídas com uma ordem específica.
Sem esse mecanismo, os dois threads iriam tentar acessar o Thread C
simultaneamente, gerando um travamento fatal, no qual ambos
esperariam indefinidamente. Com o Haiku, mensagens podem ser passadas
dentro de um aplicativo e também de outros aplicativos. O código de
message-passing do Haiku então gerencia todas as complexidades do
threading sem que o desenvolvedor precise fazê-lo.
A
principal razão pela qual o BeOS utilizou threads múltiplos foi
porque o BeBox foi concebido como uma plataforma de mídia. Um dos
motes de marketing do BeOS, de fato, era “the media OS”. Embora isso possa ter sido um pouco de exagero, o sistema era muito bom ao lidar com multimídia. Em uma demonstração típica do produto, um
BeBox executava dezenas de diferentes vídeos ao mesmo tempo, sem
nenhum atraso ou perda de quadro, enquanto o sistema ainda permanecia
responsivo. A eficiência do sistema também permitia baixa latência
em processamento de áudio. Enquanto o Haiku ainda precisa de trabalho
nessas áreas, está bem à frente de muitos outros sistemas.
Outra
vantagem que o Haiku tem sobre outros sistemas operacionais é que
ele faz uso extenso de um sistema de arquivos semelhante a um banco de
dados, o qual permite a qualquer arquivo ter vários atributos
associados a ele. Estes atributos podem ser indexados e consultados
exatamente como em um banco de dados contemporâneo. Por exemplo,
cada mensagem de e-mail no Haiku é arquivado junto com atributos
tais como o assunto, o nome do remetente e endereço, e o nome e
endereço do destinatário. A partir do gerenciador de arquivos do
sistema operacional, conhecido como Tracker, você pode pesquisar por
quaisquer daqueles atributos. Os atributos também permitem extrair as informações da música a partir de arquivos MP3 e então organizar
e pesquisar facilmente sua biblioteca musical através do Tracker.
Entradas no livro de endereços do Haiku, conhecido como arquivos
People, consistem quase que inteiramente de atributos.
Ter
seu sistema operacional a organizar seu correio eletrônico e livro
de endereços oferece uma enorme vantagem: você não mais ficará
amarrado a apenas um programa para gerenciar seu correio e contatos.
Qualquer pessoa que tenha tentado extrair velhos e-mails de um
inchado arquivo de correio do Microsoft Outlook irá entender a
beleza desta abordagem.
Em vez de ter seu correio trancado em um formato proprietário que é
acessível a partir de apenas um programa, o Haiku permite a você utilizar
qualquer programa que desejar – você ainda pode utilizar múltiplos
programas no mesmo conjunto de correios. Similarmente, os arquivos
People do Haiku podem ser editados e gerenciados por vários
programas e podem ainda ser editados de dentro do Tracker. Nenhum
outro sistema operacional implementou com tamanho sucesso um sistema de
arquivos semelhante a banco de dados.
Por
todas as suas capacidades, ao Haiku falta ainda algumas coisas importantes que
os usuários vem esperando. Por exemplo, a maioria dos sistemas
operacionais de hoje têm interfaces que são aceleradas por
hardware. O que permite gráficos extravagantes como sombras das
janelas, bordas transparentes e miniaturas de conteúdos para serem tratadas de uma forma rápida e eficiente utilizando
placas de vídeo. Usuários dos sistemas operacionais dominantes
também tem um largo conjunto de aplicativos à escolha. O Haiku
neste momento é limitado a poucos aplicativos criados
especificamente para ele ou que sobraram do BeOS.
E
como outros sistemas operacionais de código aberto, o Haiku sofre da
falta de drivers de hardware. Placas de vídeo modernas, impressoras
e outros componentes são complicados – eles são como computadores
em miniatura à sua maneira e requerem complexas peças de
software, chamados drivers, para funcionar. O driver age como uma
ponte entre o sistema operacional e o hardware. Mas nos dias de hoje existem tantos tipos, marcas e modelos de hardware que é difícil
para os desenvolvedores de código aberto acompanharem.
Felizmente,
o Haiku pode criar a partir do trabalho já feito pelos milhares de
desenvolvedores que trabalham no Linux, FreeBSD e outros sistemas
operacionais de código aberto. O Haiku já faz uso da rede do
FreeBSD e drivers de rede sem fio através de uma interface de
tradução especial. Também está em curso o trabalho de incorporar
o novo sistema Gallium3D, o qual parece ser o futuro para drivers de
vídeo no Linux.
Além do mais, muitos dos pontos fortes do Haiku provavelmente nunca serão
acompanhados pelos principais sistemas operacionais, ou pelo menos não
tão cedo. Aplicativos Linux não são projetados para usar
multithread na mesma medida do Haiku e, portanto, não podem tirar máximo proveito do moderno hardware multicore. Com o lançamento do
Snow Leopard do seu OS X há dois anos atrás, a Apple adicionou uma nova
tecnologia, chamada Grand Central Dispatch, que torna mais fácil
para os aplicativos utilizar threads múltiplas. Mas existe ainda
apenas um thread para a interface de usuário da aplicação, então
a “bola de praia da morte” permanece.
O
último lançamento do Windows 7 é uma grande melhoria sobre seu
antecessor, mas ele ainda tem muitas questões, como a inconsistência de interface generalizada e sua simples sobrecarga de
informação. O painel de controle sozinho é o bastante para causar dor de cabeça ao
usuário. O Windows é enorme, também: uma
instalação pelada do Windows 7 Ultimate irá consumir 20 gigabytes
de armazenamento. Ainda que você inclua as dezenas de aplicativos
livres que vem com o Haiku, instalar o sistema operacional irá
custar a você apenas cerca de 700 MB – um trigésimo do espaço
requerido pelo Windows 7. E quanto a ser um sistema livre e aberto,
nem Windows nem Mac OS nunca vão ser.
Finalmente,
o Haiku representa uma forma diferente de ver seu computador pessoal.
Se você acha que software não deveria ser cheio de bugs,
incompatibilidades e ineficiências, se você odeia ser forçado a
trocar seu hardware e software a cada poucos anos porque
“atualizações” os tornam obsoletos, e se você acha que a ideia
de usar um sistema operacional que é rápido, responsivo e simples é
refrescantemente nova e atraente, então talvez, apenas talvez, o
Haiku seja para você.
Este
artigo apareceu originalmente impresso como “The Dawn of Haiku”.
Sobre
o autor
Ryan
Leavengood é um consultor de informática em Boynton Beach, Flórida,
que se especializou em desenvolvimento de sítios web com Ruby on
Rails. Ele começou a se envolver no esforço open-source para criar
o sistema operacional Haiku em 2003 e é agora o tesoureiro do grupo.
Nenhum sistema operacional é perfeito, ele observa, mas “alguns
são realmente imperfeitos. Eu percebi que qualquer sistema
operacional com o qual trabalhei não podia ser pior do que aquele
que eu já estava usando”. Quando Leavengood não está
programando, ele e sua esposa, Francesca, cuidam de seus quatro
gatos, um São Bernardo e um jardim de plantas nativas da Flórida.